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PRORROGAÇÃO DA LICENÇA-MATERNIDADE: LEI 11.770/2008
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Doutrina
PRORROGAÇÃO DA LICENÇA-MATERNIDADE: LEI 11.770/2008
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
Procurador do Trabalho do Ministério Público do Trabalho na 2ª Região/SP
SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Licença-maternidade e salário-maternidade: gestante e mãe adotiva - 3. Prorrogação da licença-maternidade - 4. Conclusão - 5. Bibliografia.
1. Introdução
A recente Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008, institui o “Programa Empresa Cidadã”, destinado a prorrogar a duração da licença-maternidade.
O presente estudo tem como objetivo a análise jurídica das principais disposições e consequências decorrentes do novo diploma legal, verificando o verdadeiro alcance das suas previsões.
2. Licença-maternidade e salário-maternidade: gestante e mãe adotiva
A “licença à gestante” é prevista no art. 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988, “sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de cento e vinte dias”.
No período respectivo, assegura-se o chamado salário-maternidade, regulamentado pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/1991 e arts. 93 a 103 do Decreto 3.048/1999.
A licença-maternidade, em si, é um instituto tipicamente trabalhista, tal como se nota pelo disposto no art. 7º, inciso XVIII, da CF/1988 (pois “emprego” e “salário” denotam a existência de contrato de trabalho) e arts. 392 e 392-A da CLT (que expressamente tratam de “empregada”).
Diversamente, o salário-maternidade, com natureza de prestação previdenciária (art. 201, inciso II, da CF/1988), não se restringe à empregada, pois é um direito da “segurada da Previdência Social” de forma ampla (empregada, empregada doméstica, contribuinte individual, trabalhadora avulsa, segurada especial e segurada facultativa).
A Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, promulgada pelo Decreto 58.820/1966), estabelece que em caso algum o empregador deverá ficar pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas à mulher gestante que emprega. A previsão tem por objetivo evitar a discriminação na admissão e no ingresso da mulher no mercado de trabalho.
Cabe à empresa pagar o salário-maternidade, efetivando-se compensação quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física ou jurídica que lhe preste serviço (art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991, acrescentado pela Lei 10.710/2003). O salário-maternidade devido à trabalhadora avulsa será pago diretamente pela Previdência Social (art. 72, § 3º, da Lei 8.213/1991, acrescentado pela Lei 10.710/2003). Esse pagamento é feito diretamente pela Previdência Social também para os demais segurados (art. 73 da Lei 8.213/1991, com redação determinada pela Lei 10.710/2003), inclusive a empregada doméstica (art. 7º, parágrafo único, da CF/1988).
Como a empregada não presta serviço no período de licença-maternidade, mas recebe a respectiva remuneração, ainda que sob a forma do mencionado benefício previdenciário, entende-se tratar-se de hipótese de interrupção do contrato de trabalho.
Referido benefício, com a Lei 10.421, de 15 de abril de 2002 (a qual acrescentou à CLT o art. 392-A e, à Lei 8.213/1991, o art. 71-A), também passou a ser devido à empregada (segurada da Previdência Social) que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção da criança1. Essa mesma lei também deu nova redação ao art. 392 da CLT, que trata da empregada gestante. Eis a previsão pertinente à licença-maternidade da mãe adotiva:
“Art. 392-A. À empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança será concedida licença-maternidade nos termos do art. 392, observado o disposto no seu § 5º.
§ 1º No caso de adoção ou guarda judicial de criança até 1 (um) ano de idade, o período de licença será de 120 (cento e vinte) dias.
§ 2º No caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 1 (um) ano até 4 (quatro) anos de idade, o período de licença será de 60 (sessenta) dias.
§ 3º No caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 4 (quatro) anos até 8 (oito) anos de idade, o período de licença será de 30 (trinta) dias.
§ 4º A licença-maternidade só será concedida mediante apresentação do termo judicial de guarda à adotante ou guardiã”.
Frise-se que “a proteção à maternidade e à infância” (e não somente à gestante) é um direito social, com fundamento constitucional (art. 6º da Lei Maior). Com a adoção da criança pela empregada, esta se torna mãe, o que a faz merecer a proteção legal. Quanto aos filhos havidos por adoção, merece destaque a norma contida no art. 227, § 6º, da Constituição Federal, que assim estabelece: “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.
A empregada que adotar criança ou obtiver guarda judicial para fins de adoção, a partir de 16.04.2002 (data da publicação da Lei 10.421, conforme os arts. 5º e 6º), tem direito à licença-maternidade, prevista no art. 392, observando-se os períodos de licença previstos nos §§ 1º a 3º do art. 392-A, ambos da CLT.
A licença é devida desde que a criança tenha até oito anos de idade quando da adoção ou da guarda judicial. Como prevê o art. 93-A do Decreto 3.048/1999 (acrescentado pelo Decreto 4.729/2003), o salário-maternidade é devido “a partir de quatro anos até completar oito anos, por trinta dias” (destaquei).
Sendo essa licença-maternidade concedida “nos termos do art. 392”, o afastamento em questão é “sem prejuízo do emprego e do salário”, também configurando hipótese de interrupção do contrato de trabalho.
Nessa linha, o art. 28 do Regulamento do FGTS, aprovado pelo Decreto 99.684/1990, regulamentando a Lei 8.036/1990, estabelece ser obrigatório o depósito na conta vinculada do FGTS “também nos casos de interrupção do contrato de trabalho prevista em lei”, tais como a “licença à gestante” (inciso IV).
3. Prorrogação da licença-maternidade
A Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008 (publicada no DOU de 10.09.2008), a institui o “Programa Empresa Cidadã”, com o objetivo de prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade prevista no art. 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988 (art. 1º).
Conforme a previsão do art. 1º, § 1º, da referida Lei 11.770/2008, essa prorrogação da licença-maternidade será garantida à empregada da pessoa jurídica que aderir ao Programa, desde que a empregada a requeira até o final do primeiro mês após o parto, e concedida imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o art. 7º, inciso XVIII, da CF/1988. A prorrogação será garantida, na mesma proporção, também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança (art. 1º, § 2º).
Como se nota, de acordo com a previsão legal, a prorrogação (por 60 dias) da duração da licença-maternidade depende de dois requisitos para ser concedida:
a) ser empregada de pessoa jurídica que tenha aderido ao Programa Empresa Cidadã; e
b) requerimento da empregada a até o final do primeiro mês após o parto.
Entende-se que esse requerimento deve ser apresentado pela empregada, no prazo mencionado, ao empregador pessoa jurídica. O art. 5º do mesmo diploma legal restringe à “pessoa jurídica tributada com base no lucro real” a possibilidade de deduzir do imposto devido o total da remuneração integral da empregada referente aos 60 dias de prorrogação de sua licença-maternidade. Assim sendo, de acordo com a interpretação sistemática da Lei em questão, a adesão ao mencionado Programa Empresa Cidadã, em tese, apenas pode ser feita por “pessoa jurídica tributada com base no lucro real”.
Presentes ambos os requisitos, a prorrogação da duração da licença-maternidade deve ser concedida, iniciando-se imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o art. 7º, inciso XVIII, da CF/1988. Desse modo, uma vez concedida à prorrogação, a empregada fará jus aos 120 dias de licença-maternidade, mais a prorrogação de 60 dias, somando 180 dias no total.
Como já estudado, a licença-maternidade passou a ser devida também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção da criança (Lei 10.421, de 15 de abril de 2002, a qual acrescentou à CLT o art. 392-A e, à Lei 8.213/1991, o art. 71-A). Em razão disso, o art. 1º, § 2º da Lei 11.770/2008, dispõe que a prorrogação da licença-maternidade “será garantida, na mesma proporção, também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança”. Embora o termo “na mesma proporção” possa gerar alguma dúvida em sua interpretação, pois o período da licença-maternidade da mãe adotante, em si, varia de acordo com a idade da criança adotada ou referente à guarda judicial (art. 392-A da CLT), entende-se que o intuito foi o de assegurar, nesses casos, a prorrogação com a mesma quantidade de dias da prorrogação da licença-maternidade da gestante, ou seja, sempre por 60 dias. Afinal, a norma não diz que a prorrogação deve ser de forma proporcional ao período da licença-maternidade da mãe adotante, mas sim garante a prorrogação também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança, na mesma proporção, isto é, em idêntica quantidade da prorrogação da licença-maternidade prevista no art. 1º, caput da Lei 11.770/2008 (60 dias). Entretanto, parece prevalecer o entendimento de que no caso da empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança, a prorrogação da licença-maternidade deve ser proporcional ao período da licença-maternidade em si, seguindo a proporção prevista no art. 71-A da Lei 8.213/1991. Desse modo, a prorrogação da licença-maternidade da mãe adotante seria de: 60 dias, no caso de criança de até um ano de idade; 30 dias, no caso de criança de mais de um e menos de quatro anos de idade; 15 dias, no caso de criança de quatro a oito anos de idade. Nesse sentido prevê o art. 2º, § 3º, inciso I, do Decreto 6.690, de 11 de dezembro de 2008, o qual institui, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, o Programa de Prorrogação da Licença à Gestante e à Adotante.
O art. 2º da Lei 11.770/2008, por sua vez, autoriza que a Administração Pública (direta, indireta e fundacional) institua programa que garanta prorrogação da licença-maternidade para suas servidoras, nos termos do que prevê o art. 1º da referida Lei.
Durante o período de prorrogação da licença-maternidade, a empregada terá direito à sua remuneração integral, nos mesmos moldes devidos no período de percepção do salário-maternidade pago pelo regime geral de previdência social (art. 3º da Lei 11.770/2008). Assim sendo, pode-se concluir que o período de prorrogação da licença-maternidade também tem natureza de interrupção do contrato de trabalho, pois embora ausente a prestação de serviços, a remuneração permanece devida. O art. 6º da Lei 11.770 alterava o art. 28, § 9º, e, da Lei 8.212/91, passando a estabelecer que não integram o salário-de-contribuição as importâncias “recebidas a título de prorrogação da licença-maternidade, no âmbito do Programa Empresa Cidadã, sem prejuízo da contagem do tempo de contribuição da segurada”, mas isso foi vetado. Conforme as razões do veto, entendeu-se que “se nos 120 dias de licença gestante, quando é devido à segurada o salário-maternidade, há a incidência de contribuição previdenciária [art. 28, § 9º, a, parte final, da Lei 8.212/91], seria contraditório a não incidência dessa contribuição sobre os valores referentes à prorrogação da licença, que tem as mesmas características do salário-maternidade devido nos primeiros 120 dias de licença”.
No período de prorrogação da licença-maternidade de que trata a Lei 11.770/2008, a empregada não poderá exercer qualquer atividade remunerada e a criança não poderá ser mantida em creche ou organização similar. Em caso de descumprimento dessa disposição, a empregada perderá o direito à prorrogação (art. 4º). Na realidade, a prorrogação da licença-maternidade, prevista pela Lei 11.770/2008, tem como objetivo permitir que a mãe possa permanecer em contato direto com a criança por mais tempo, facilitando até mesmo o aleitamento materno. Por isso, entendeu-se que no período de prorrogação mencionado a empregada não pode exercer qualquer atividade remunerada e a criança não pode ser mantida em creche ou organização similar, pois isso inviabilizaria os objetivos pretendidos pela norma jurídica. Coerentemente, a consequência por eventual descumprimento dessa previsão é a perda do direito à prorrogação da licença, desde o momento em que ocorrer a inobservância dos referidos deveres.
De acordo com o art. 5º da Lei 11.770/2008: “A pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá deduzir do imposto devido, em cada período de apuração, o total da remuneração integral da empregada pago nos 60 (sessenta) dias de prorrogação de sua licença-maternidade, vedada a dedução como despesa operacional”.
Desse modo, confere-se à pessoa jurídica tributada com base no lucro real a possibilidade de deduzir, do imposto devido, o total da remuneração integral da empregada referente aos 60 dias de prorrogação de sua licença-maternidade. O parágrafo único do art. 5º previa que “o disposto neste artigo aplica-se às pessoas jurídicas enquadradas no regime do lucro presumido e às optantes pelo Sistema Integrado de Pagamentos de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES”, mas foi vetado.
Certamente em razão da previsão do art. 5º, caput, da Lei 11.770/2008, é que o art. 1º, § 1º, do mesmo diploma legal, estabelece que a prorrogação da licença-maternidade “será garantida à empregada da pessoa jurídica” que aderir ao Programa Empresa Cidadã, sabendo-se que a “pessoa jurídica tributada com base no lucro real” é que pode deduzir do imposto devido o total da remuneração integral da empregada referente aos 60 dias de prorrogação de sua licença-maternidade (art. 5º).
A finalidade do disposto no art. 5º da Lei 11.770/2008 é afastar eventual discriminação no mercado de trabalho, vedada pelo art. 7º, inciso XXX, da CF/1988, o qual estabelece a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. Dessa forma, possibilita-se que a remuneração devida na prorrogação da licença-maternidade seja objeto de dedução do imposto devido pela pessoa jurídica tributada com base no lucro real. Se o empregador tivesse de arcar, definitivamente, com o valor dessa remuneração, sem poder deduzir o valor do imposto devido, poderia passar a evitar a contratação da mulher, incorrendo em discriminação, o que não é admitido pelo Direito. Mesmo assim, há entendimento de que essa prorrogação da licença-maternidade poderia causar consequências negativas para a admissão da mulher no mercado de trabalho, tendo em vista que o empregador passaria a ter de realizar a sua substituição durante o período em questão. Entretanto, a substituição provisória de empregados, de certo modo, faz parte da rotina das empresas (art. 450 da CLT e Súmula 159 do TST), e a sua possibilidade já existia mesmo no caso da licença-maternidade em si.
Ainda assim, como o direito de prorrogação da licença-maternidade não foi previsto também para as empregadas de “pessoa física ou natural”, e mesmo a renúncia fiscal mencionada (art. 5º) não foi estendida às pessoas jurídicas tributadas com base em lucro presumido2 e às optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional - Lei Complementar 123/2006, art. 12), é possível surgirem questionamentos a respeito desse tratamento desigual.
Em conformidade com o art. 7º da Lei 11.770/2008: “O Poder Executivo, com vistas no cumprimento do disposto no inciso II do caput do art. 5º e nos arts. 12 e 14 da Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000, estimará o montante da renúncia fiscal decorrente do disposto nesta Lei e o incluirá no demonstrativo a que se refere o § 6º do art. 165 da Constituição Federal, que acompanhará o projeto de lei orçamentária cuja apresentação se der após decorridos 60 (sessenta) dias da publicação desta Lei”.
Assim sendo, em cumprimento aos preceitos da Lei de Responsabilidade Fiscal, cabe ao Poder Executivo estimar o montante da renúncia fiscal decorrente do disposto na Lei 11.770/2008, mais especificamente de seu art. 5º, acima analisado. Além disso, o Poder Executivo deve incluir esse montante estimado da renúncia fiscal no “demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, decorrente de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia” (art. 165, § 6º, da Constituição Federal de 1988), que acompanhará o projeto de lei orçamentária cuja apresentação se der após decorridos 60 dias da publicação da Lei 11.770/2008 (a qual foi publicada no DOU de 10.09.2008).
Quanto ao orçamento anual, o Presidente da República deve enviar o respectivo projeto de lei ao Congresso Nacional (art. 84, inciso XXIII, da CF/1988) até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro (art. 35, § 2º, III, do ADCT, ou seja, até o mês de agosto de cada exercício3). Por isso, tendo em vista o prazo de 60 dias previsto no art. 7º da Lei 11.770/2008, pode-se entender que o projeto de lei orçamentária mencionado será aquele a ser apresentado até agosto de 2009 (até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro de 2009), referindo-se ao exercício financeiro de 2010 (que coincide com o ano civil de 2010)4.
A Lei 11.770/2008, de acordo com o seu art. 8º, entra em vigor na data de sua publicação, “produzindo efeitos a partir do primeiro dia do exercício subsequente àquele em que for implementado o disposto no seu art. 7º”. Em razão disso, é possível entender que a possibilidade de prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade (art. 1º), ocorre a partir do primeiro dia do ano de 2010, por ser o exercício subsequente àquele em que se deve realizar o disposto no art. 7º.
4. Conclusão
O ordenamento jurídico reconhece o direito à licença-maternidade, com o respectivo salário-maternidade, à gestante e mãe adotiva.
Por meio da recente Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008, foi instituído o “Programa Empresa Cidadã”, destinado a prorrogar a duração da licença-maternidade.
Entretanto, nota-se que a prorrogação da licença-maternidade, com aplicação da renúncia fiscal prevista no art. 5º da Lei 11.770, acabou ficando limitada às empresas de maior porte, que são as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, certamente como forma de limitar a queda nas receitas públicas. Assim, se o empregador não for uma pessoa jurídica que preencha as exigências dos arts. 1º, § 1º, e 5º da referida Lei, e mesmo assim queira conceder uma prorrogação da licença-maternidade, a rigor, não terá direito à mencionada renúncia fiscal, de modo que isso seria, em verdade, uma simples licença remunerada.
Cabe, assim, acompanhar a evolução legislativa e jurisprudencial a respeito da relevante matéria.
5. Bibliografia
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1997.
OLIVEIRA, Regis Fernandes de; HORVATH, Estevão. Manual de direito financeiro. 2. ed. São Paulo: RT, 1997.
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: Método, 2008.
Gustavo Filipe Barbosa Garcia é Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Procurador do Trabalho do Ministério Público do Trabalho na 2ª Região, professor universitário, ex-Juiz do Trabalho das 2ª, 8ª e 24ª Regiões e ex-Auditor Fiscal do Trabalho.
______________
Notas de Rodapé
1 Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: Método, 2008. p. 496-500.
2 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 224: “As firmas individuais e as pessoas jurídicas cuja receita bruta seja inferior a determinado montante e que atendam, ainda, a outras exigências da lei ficam dispensadas de fazer a escrituração contábil de suas transações e o imposto de renda, nestes casos, é calculado sobre o lucro presumido, que é determinado pela aplicação de coeficientes legalmente definidos, sobre a receita bruta anual, conforme a natureza da atividade”.
Cf. Lei 9.718/1998:
“Art. 13. A pessoa jurídica cuja receita bruta total, no ano-calendário anterior, tenha sido igual ou inferior a R$ 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de reais), ou a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) multiplicado pelo número de meses de atividade do ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses, poderá optar pelo regime de tributação com base no lucro presumido. (redação determinada pela Lei 10.637/2002).
§ 1º A opção pela tributação com base no lucro presumido será definitiva em relação a todo o ano-calendário.
§ 2º Relativamente aos limites estabelecidos neste artigo, a receita bruta auferida no ano anterior será considerada segundo o regime de competência ou de caixa, observado o critério adotado pela pessoa jurídica, caso tenha, naquele ano, optado pela tributação com base no lucro presumido.
Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas:
I - cuja receita total, no ano-calendário anterior seja superior ao limite de R$ 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de reais), ou proporcional ao número de meses do período, quando inferior a 12 (doze) meses; (redação determinada pela Lei 10.637/2002).
II - cujas atividades sejam de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras de títulos, valores mobiliários e câmbio, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de seguros privados e de capitalização e entidades de previdência privada aberta;
III - que tiverem lucros, rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior;
IV - que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais relativos à isenção ou redução do imposto;
V - que, no decorrer do ano-calendário, tenham efetuado pagamento mensal pelo regime de estimativa, na forma do art. 2º da Lei nº 9.430, de 1996;
VI - que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).”
3 Cf. OLIVEIRA, Regis Fernandes de; HORVATH, Estevão. Manual de direito financeiro. 2. ed. São Paulo: RT, 1997. p. 86.
Cf. Lei 4.320/1964, art. 22: “A proposta orçamentária que o Poder Executivo encaminhará ao Poder Legislativo nos prazos estabelecidos nas Constituições e nas Leis Orgânicas dos Municípios, compor-se-á: [...]”. Cf. art. 35, § 2º, do ADCT: “III - o projeto de lei orçamentária da União será encaminhado até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento da sessão legislativa”.
4 Cf. Lei 4.320/1964, art. 34: “O exercício financeiro coincidirá com o ano civil”.
“Trabalho em Revista”, encarte de DOUTRINA “O TRABALHO” – Fascículo n.º 145, Março/2009, p. 4899.
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
Procurador do Trabalho do Ministério Público do Trabalho na 2ª Região/SP
SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Licença-maternidade e salário-maternidade: gestante e mãe adotiva - 3. Prorrogação da licença-maternidade - 4. Conclusão - 5. Bibliografia.
1. Introdução
A recente Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008, institui o “Programa Empresa Cidadã”, destinado a prorrogar a duração da licença-maternidade.
O presente estudo tem como objetivo a análise jurídica das principais disposições e consequências decorrentes do novo diploma legal, verificando o verdadeiro alcance das suas previsões.
2. Licença-maternidade e salário-maternidade: gestante e mãe adotiva
A “licença à gestante” é prevista no art. 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988, “sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de cento e vinte dias”.
No período respectivo, assegura-se o chamado salário-maternidade, regulamentado pelos arts. 71 a 73 da Lei 8.213/1991 e arts. 93 a 103 do Decreto 3.048/1999.
A licença-maternidade, em si, é um instituto tipicamente trabalhista, tal como se nota pelo disposto no art. 7º, inciso XVIII, da CF/1988 (pois “emprego” e “salário” denotam a existência de contrato de trabalho) e arts. 392 e 392-A da CLT (que expressamente tratam de “empregada”).
Diversamente, o salário-maternidade, com natureza de prestação previdenciária (art. 201, inciso II, da CF/1988), não se restringe à empregada, pois é um direito da “segurada da Previdência Social” de forma ampla (empregada, empregada doméstica, contribuinte individual, trabalhadora avulsa, segurada especial e segurada facultativa).
A Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, promulgada pelo Decreto 58.820/1966), estabelece que em caso algum o empregador deverá ficar pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas à mulher gestante que emprega. A previsão tem por objetivo evitar a discriminação na admissão e no ingresso da mulher no mercado de trabalho.
Cabe à empresa pagar o salário-maternidade, efetivando-se compensação quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física ou jurídica que lhe preste serviço (art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991, acrescentado pela Lei 10.710/2003). O salário-maternidade devido à trabalhadora avulsa será pago diretamente pela Previdência Social (art. 72, § 3º, da Lei 8.213/1991, acrescentado pela Lei 10.710/2003). Esse pagamento é feito diretamente pela Previdência Social também para os demais segurados (art. 73 da Lei 8.213/1991, com redação determinada pela Lei 10.710/2003), inclusive a empregada doméstica (art. 7º, parágrafo único, da CF/1988).
Como a empregada não presta serviço no período de licença-maternidade, mas recebe a respectiva remuneração, ainda que sob a forma do mencionado benefício previdenciário, entende-se tratar-se de hipótese de interrupção do contrato de trabalho.
Referido benefício, com a Lei 10.421, de 15 de abril de 2002 (a qual acrescentou à CLT o art. 392-A e, à Lei 8.213/1991, o art. 71-A), também passou a ser devido à empregada (segurada da Previdência Social) que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção da criança1. Essa mesma lei também deu nova redação ao art. 392 da CLT, que trata da empregada gestante. Eis a previsão pertinente à licença-maternidade da mãe adotiva:
“Art. 392-A. À empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança será concedida licença-maternidade nos termos do art. 392, observado o disposto no seu § 5º.
§ 1º No caso de adoção ou guarda judicial de criança até 1 (um) ano de idade, o período de licença será de 120 (cento e vinte) dias.
§ 2º No caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 1 (um) ano até 4 (quatro) anos de idade, o período de licença será de 60 (sessenta) dias.
§ 3º No caso de adoção ou guarda judicial de criança a partir de 4 (quatro) anos até 8 (oito) anos de idade, o período de licença será de 30 (trinta) dias.
§ 4º A licença-maternidade só será concedida mediante apresentação do termo judicial de guarda à adotante ou guardiã”.
Frise-se que “a proteção à maternidade e à infância” (e não somente à gestante) é um direito social, com fundamento constitucional (art. 6º da Lei Maior). Com a adoção da criança pela empregada, esta se torna mãe, o que a faz merecer a proteção legal. Quanto aos filhos havidos por adoção, merece destaque a norma contida no art. 227, § 6º, da Constituição Federal, que assim estabelece: “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.
A empregada que adotar criança ou obtiver guarda judicial para fins de adoção, a partir de 16.04.2002 (data da publicação da Lei 10.421, conforme os arts. 5º e 6º), tem direito à licença-maternidade, prevista no art. 392, observando-se os períodos de licença previstos nos §§ 1º a 3º do art. 392-A, ambos da CLT.
A licença é devida desde que a criança tenha até oito anos de idade quando da adoção ou da guarda judicial. Como prevê o art. 93-A do Decreto 3.048/1999 (acrescentado pelo Decreto 4.729/2003), o salário-maternidade é devido “a partir de quatro anos até completar oito anos, por trinta dias” (destaquei).
Sendo essa licença-maternidade concedida “nos termos do art. 392”, o afastamento em questão é “sem prejuízo do emprego e do salário”, também configurando hipótese de interrupção do contrato de trabalho.
Nessa linha, o art. 28 do Regulamento do FGTS, aprovado pelo Decreto 99.684/1990, regulamentando a Lei 8.036/1990, estabelece ser obrigatório o depósito na conta vinculada do FGTS “também nos casos de interrupção do contrato de trabalho prevista em lei”, tais como a “licença à gestante” (inciso IV).
3. Prorrogação da licença-maternidade
A Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008 (publicada no DOU de 10.09.2008), a institui o “Programa Empresa Cidadã”, com o objetivo de prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade prevista no art. 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988 (art. 1º).
Conforme a previsão do art. 1º, § 1º, da referida Lei 11.770/2008, essa prorrogação da licença-maternidade será garantida à empregada da pessoa jurídica que aderir ao Programa, desde que a empregada a requeira até o final do primeiro mês após o parto, e concedida imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o art. 7º, inciso XVIII, da CF/1988. A prorrogação será garantida, na mesma proporção, também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança (art. 1º, § 2º).
Como se nota, de acordo com a previsão legal, a prorrogação (por 60 dias) da duração da licença-maternidade depende de dois requisitos para ser concedida:
a) ser empregada de pessoa jurídica que tenha aderido ao Programa Empresa Cidadã; e
b) requerimento da empregada a até o final do primeiro mês após o parto.
Entende-se que esse requerimento deve ser apresentado pela empregada, no prazo mencionado, ao empregador pessoa jurídica. O art. 5º do mesmo diploma legal restringe à “pessoa jurídica tributada com base no lucro real” a possibilidade de deduzir do imposto devido o total da remuneração integral da empregada referente aos 60 dias de prorrogação de sua licença-maternidade. Assim sendo, de acordo com a interpretação sistemática da Lei em questão, a adesão ao mencionado Programa Empresa Cidadã, em tese, apenas pode ser feita por “pessoa jurídica tributada com base no lucro real”.
Presentes ambos os requisitos, a prorrogação da duração da licença-maternidade deve ser concedida, iniciando-se imediatamente após a fruição da licença-maternidade de que trata o art. 7º, inciso XVIII, da CF/1988. Desse modo, uma vez concedida à prorrogação, a empregada fará jus aos 120 dias de licença-maternidade, mais a prorrogação de 60 dias, somando 180 dias no total.
Como já estudado, a licença-maternidade passou a ser devida também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção da criança (Lei 10.421, de 15 de abril de 2002, a qual acrescentou à CLT o art. 392-A e, à Lei 8.213/1991, o art. 71-A). Em razão disso, o art. 1º, § 2º da Lei 11.770/2008, dispõe que a prorrogação da licença-maternidade “será garantida, na mesma proporção, também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança”. Embora o termo “na mesma proporção” possa gerar alguma dúvida em sua interpretação, pois o período da licença-maternidade da mãe adotante, em si, varia de acordo com a idade da criança adotada ou referente à guarda judicial (art. 392-A da CLT), entende-se que o intuito foi o de assegurar, nesses casos, a prorrogação com a mesma quantidade de dias da prorrogação da licença-maternidade da gestante, ou seja, sempre por 60 dias. Afinal, a norma não diz que a prorrogação deve ser de forma proporcional ao período da licença-maternidade da mãe adotante, mas sim garante a prorrogação também à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança, na mesma proporção, isto é, em idêntica quantidade da prorrogação da licença-maternidade prevista no art. 1º, caput da Lei 11.770/2008 (60 dias). Entretanto, parece prevalecer o entendimento de que no caso da empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança, a prorrogação da licença-maternidade deve ser proporcional ao período da licença-maternidade em si, seguindo a proporção prevista no art. 71-A da Lei 8.213/1991. Desse modo, a prorrogação da licença-maternidade da mãe adotante seria de: 60 dias, no caso de criança de até um ano de idade; 30 dias, no caso de criança de mais de um e menos de quatro anos de idade; 15 dias, no caso de criança de quatro a oito anos de idade. Nesse sentido prevê o art. 2º, § 3º, inciso I, do Decreto 6.690, de 11 de dezembro de 2008, o qual institui, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, o Programa de Prorrogação da Licença à Gestante e à Adotante.
O art. 2º da Lei 11.770/2008, por sua vez, autoriza que a Administração Pública (direta, indireta e fundacional) institua programa que garanta prorrogação da licença-maternidade para suas servidoras, nos termos do que prevê o art. 1º da referida Lei.
Durante o período de prorrogação da licença-maternidade, a empregada terá direito à sua remuneração integral, nos mesmos moldes devidos no período de percepção do salário-maternidade pago pelo regime geral de previdência social (art. 3º da Lei 11.770/2008). Assim sendo, pode-se concluir que o período de prorrogação da licença-maternidade também tem natureza de interrupção do contrato de trabalho, pois embora ausente a prestação de serviços, a remuneração permanece devida. O art. 6º da Lei 11.770 alterava o art. 28, § 9º, e, da Lei 8.212/91, passando a estabelecer que não integram o salário-de-contribuição as importâncias “recebidas a título de prorrogação da licença-maternidade, no âmbito do Programa Empresa Cidadã, sem prejuízo da contagem do tempo de contribuição da segurada”, mas isso foi vetado. Conforme as razões do veto, entendeu-se que “se nos 120 dias de licença gestante, quando é devido à segurada o salário-maternidade, há a incidência de contribuição previdenciária [art. 28, § 9º, a, parte final, da Lei 8.212/91], seria contraditório a não incidência dessa contribuição sobre os valores referentes à prorrogação da licença, que tem as mesmas características do salário-maternidade devido nos primeiros 120 dias de licença”.
No período de prorrogação da licença-maternidade de que trata a Lei 11.770/2008, a empregada não poderá exercer qualquer atividade remunerada e a criança não poderá ser mantida em creche ou organização similar. Em caso de descumprimento dessa disposição, a empregada perderá o direito à prorrogação (art. 4º). Na realidade, a prorrogação da licença-maternidade, prevista pela Lei 11.770/2008, tem como objetivo permitir que a mãe possa permanecer em contato direto com a criança por mais tempo, facilitando até mesmo o aleitamento materno. Por isso, entendeu-se que no período de prorrogação mencionado a empregada não pode exercer qualquer atividade remunerada e a criança não pode ser mantida em creche ou organização similar, pois isso inviabilizaria os objetivos pretendidos pela norma jurídica. Coerentemente, a consequência por eventual descumprimento dessa previsão é a perda do direito à prorrogação da licença, desde o momento em que ocorrer a inobservância dos referidos deveres.
De acordo com o art. 5º da Lei 11.770/2008: “A pessoa jurídica tributada com base no lucro real poderá deduzir do imposto devido, em cada período de apuração, o total da remuneração integral da empregada pago nos 60 (sessenta) dias de prorrogação de sua licença-maternidade, vedada a dedução como despesa operacional”.
Desse modo, confere-se à pessoa jurídica tributada com base no lucro real a possibilidade de deduzir, do imposto devido, o total da remuneração integral da empregada referente aos 60 dias de prorrogação de sua licença-maternidade. O parágrafo único do art. 5º previa que “o disposto neste artigo aplica-se às pessoas jurídicas enquadradas no regime do lucro presumido e às optantes pelo Sistema Integrado de Pagamentos de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES”, mas foi vetado.
Certamente em razão da previsão do art. 5º, caput, da Lei 11.770/2008, é que o art. 1º, § 1º, do mesmo diploma legal, estabelece que a prorrogação da licença-maternidade “será garantida à empregada da pessoa jurídica” que aderir ao Programa Empresa Cidadã, sabendo-se que a “pessoa jurídica tributada com base no lucro real” é que pode deduzir do imposto devido o total da remuneração integral da empregada referente aos 60 dias de prorrogação de sua licença-maternidade (art. 5º).
A finalidade do disposto no art. 5º da Lei 11.770/2008 é afastar eventual discriminação no mercado de trabalho, vedada pelo art. 7º, inciso XXX, da CF/1988, o qual estabelece a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. Dessa forma, possibilita-se que a remuneração devida na prorrogação da licença-maternidade seja objeto de dedução do imposto devido pela pessoa jurídica tributada com base no lucro real. Se o empregador tivesse de arcar, definitivamente, com o valor dessa remuneração, sem poder deduzir o valor do imposto devido, poderia passar a evitar a contratação da mulher, incorrendo em discriminação, o que não é admitido pelo Direito. Mesmo assim, há entendimento de que essa prorrogação da licença-maternidade poderia causar consequências negativas para a admissão da mulher no mercado de trabalho, tendo em vista que o empregador passaria a ter de realizar a sua substituição durante o período em questão. Entretanto, a substituição provisória de empregados, de certo modo, faz parte da rotina das empresas (art. 450 da CLT e Súmula 159 do TST), e a sua possibilidade já existia mesmo no caso da licença-maternidade em si.
Ainda assim, como o direito de prorrogação da licença-maternidade não foi previsto também para as empregadas de “pessoa física ou natural”, e mesmo a renúncia fiscal mencionada (art. 5º) não foi estendida às pessoas jurídicas tributadas com base em lucro presumido2 e às optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional - Lei Complementar 123/2006, art. 12), é possível surgirem questionamentos a respeito desse tratamento desigual.
Em conformidade com o art. 7º da Lei 11.770/2008: “O Poder Executivo, com vistas no cumprimento do disposto no inciso II do caput do art. 5º e nos arts. 12 e 14 da Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000, estimará o montante da renúncia fiscal decorrente do disposto nesta Lei e o incluirá no demonstrativo a que se refere o § 6º do art. 165 da Constituição Federal, que acompanhará o projeto de lei orçamentária cuja apresentação se der após decorridos 60 (sessenta) dias da publicação desta Lei”.
Assim sendo, em cumprimento aos preceitos da Lei de Responsabilidade Fiscal, cabe ao Poder Executivo estimar o montante da renúncia fiscal decorrente do disposto na Lei 11.770/2008, mais especificamente de seu art. 5º, acima analisado. Além disso, o Poder Executivo deve incluir esse montante estimado da renúncia fiscal no “demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, decorrente de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia” (art. 165, § 6º, da Constituição Federal de 1988), que acompanhará o projeto de lei orçamentária cuja apresentação se der após decorridos 60 dias da publicação da Lei 11.770/2008 (a qual foi publicada no DOU de 10.09.2008).
Quanto ao orçamento anual, o Presidente da República deve enviar o respectivo projeto de lei ao Congresso Nacional (art. 84, inciso XXIII, da CF/1988) até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro (art. 35, § 2º, III, do ADCT, ou seja, até o mês de agosto de cada exercício3). Por isso, tendo em vista o prazo de 60 dias previsto no art. 7º da Lei 11.770/2008, pode-se entender que o projeto de lei orçamentária mencionado será aquele a ser apresentado até agosto de 2009 (até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro de 2009), referindo-se ao exercício financeiro de 2010 (que coincide com o ano civil de 2010)4.
A Lei 11.770/2008, de acordo com o seu art. 8º, entra em vigor na data de sua publicação, “produzindo efeitos a partir do primeiro dia do exercício subsequente àquele em que for implementado o disposto no seu art. 7º”. Em razão disso, é possível entender que a possibilidade de prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade (art. 1º), ocorre a partir do primeiro dia do ano de 2010, por ser o exercício subsequente àquele em que se deve realizar o disposto no art. 7º.
4. Conclusão
O ordenamento jurídico reconhece o direito à licença-maternidade, com o respectivo salário-maternidade, à gestante e mãe adotiva.
Por meio da recente Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008, foi instituído o “Programa Empresa Cidadã”, destinado a prorrogar a duração da licença-maternidade.
Entretanto, nota-se que a prorrogação da licença-maternidade, com aplicação da renúncia fiscal prevista no art. 5º da Lei 11.770, acabou ficando limitada às empresas de maior porte, que são as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, certamente como forma de limitar a queda nas receitas públicas. Assim, se o empregador não for uma pessoa jurídica que preencha as exigências dos arts. 1º, § 1º, e 5º da referida Lei, e mesmo assim queira conceder uma prorrogação da licença-maternidade, a rigor, não terá direito à mencionada renúncia fiscal, de modo que isso seria, em verdade, uma simples licença remunerada.
Cabe, assim, acompanhar a evolução legislativa e jurisprudencial a respeito da relevante matéria.
5. Bibliografia
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1997.
OLIVEIRA, Regis Fernandes de; HORVATH, Estevão. Manual de direito financeiro. 2. ed. São Paulo: RT, 1997.
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: Método, 2008.
Gustavo Filipe Barbosa Garcia é Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Procurador do Trabalho do Ministério Público do Trabalho na 2ª Região, professor universitário, ex-Juiz do Trabalho das 2ª, 8ª e 24ª Regiões e ex-Auditor Fiscal do Trabalho.
______________
Notas de Rodapé
1 Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: Método, 2008. p. 496-500.
2 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 224: “As firmas individuais e as pessoas jurídicas cuja receita bruta seja inferior a determinado montante e que atendam, ainda, a outras exigências da lei ficam dispensadas de fazer a escrituração contábil de suas transações e o imposto de renda, nestes casos, é calculado sobre o lucro presumido, que é determinado pela aplicação de coeficientes legalmente definidos, sobre a receita bruta anual, conforme a natureza da atividade”.
Cf. Lei 9.718/1998:
“Art. 13. A pessoa jurídica cuja receita bruta total, no ano-calendário anterior, tenha sido igual ou inferior a R$ 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de reais), ou a R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) multiplicado pelo número de meses de atividade do ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses, poderá optar pelo regime de tributação com base no lucro presumido. (redação determinada pela Lei 10.637/2002).
§ 1º A opção pela tributação com base no lucro presumido será definitiva em relação a todo o ano-calendário.
§ 2º Relativamente aos limites estabelecidos neste artigo, a receita bruta auferida no ano anterior será considerada segundo o regime de competência ou de caixa, observado o critério adotado pela pessoa jurídica, caso tenha, naquele ano, optado pela tributação com base no lucro presumido.
Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas:
I - cuja receita total, no ano-calendário anterior seja superior ao limite de R$ 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de reais), ou proporcional ao número de meses do período, quando inferior a 12 (doze) meses; (redação determinada pela Lei 10.637/2002).
II - cujas atividades sejam de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras de títulos, valores mobiliários e câmbio, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de seguros privados e de capitalização e entidades de previdência privada aberta;
III - que tiverem lucros, rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior;
IV - que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais relativos à isenção ou redução do imposto;
V - que, no decorrer do ano-calendário, tenham efetuado pagamento mensal pelo regime de estimativa, na forma do art. 2º da Lei nº 9.430, de 1996;
VI - que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).”
3 Cf. OLIVEIRA, Regis Fernandes de; HORVATH, Estevão. Manual de direito financeiro. 2. ed. São Paulo: RT, 1997. p. 86.
Cf. Lei 4.320/1964, art. 22: “A proposta orçamentária que o Poder Executivo encaminhará ao Poder Legislativo nos prazos estabelecidos nas Constituições e nas Leis Orgânicas dos Municípios, compor-se-á: [...]”. Cf. art. 35, § 2º, do ADCT: “III - o projeto de lei orçamentária da União será encaminhado até quatro meses antes do encerramento do exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento da sessão legislativa”.
4 Cf. Lei 4.320/1964, art. 34: “O exercício financeiro coincidirá com o ano civil”.
“Trabalho em Revista”, encarte de DOUTRINA “O TRABALHO” – Fascículo n.º 145, Março/2009, p. 4899.
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